skip to Main Content

A pandemia da Covid-19 interferiu no consumo midiático?

Andressa Butture Kniess*

          No texto “Does a crisis change news habits? A comparative study of the effects of Covid-19 on news media use in 17 european countries”, Van Aelst e colegas (2021) investigam se a pandemia da Covid-19 ocasionou mudanças no consumo de notícias tradicionais e digitais. Os autores afirmam que, no passado, em momentos de crise, as pessoas recorriam às mídias tradicionais para obter informações. O texto busca entender se isso também acontece em ambientes midiáticos contemporâneos.

          Para isso, os autores utilizam uma pesquisa de painel comparativa que considera 17 democracias: Suécia, Dinamarca, Noruega, Bélgica, Holanda, Alemanha, Suíça, Grã-Bretanha, Espanha, Israel, Romênia, França, Áustria, Itália, Polônia, Hungria e Romênia. A primeira onda do survey foi aplicada antes da pandemia da Covid-19, em dezembro de 2019. E a segunda ocorreu em maio de 2020, quando parte dos países analisados se recuperava da primeira onda de casos e mortes. Em cada país, aproximadamente 800 entrevistados participaram das duas fases da pesquisa.

          Van Aelst e colegas (2021) se propõem a testar sete hipóteses de pesquisa:

H1) A pandemia Covid-19 levou a um aumento no consumo de notícias.

H1a) A pandemia COVID-19 levou a um aumento no consumo de noticiários televisivos.

H1b) O aumento do consumo de noticiários televisivos foi maior para os canais de televisão de serviço público do que para os canais de televisão comercial.

H1c) O crescimento do consumo de jornais de elite foi maior do que o consumo de imprensa popular.

H1d) A pandemia Covid-19 levou a um aumento no consumo de mídias contemporâneas (notícias digitais e redes sociais digitais).

H2) O aumento no consumo de mídias tradicionais foi maior para pessoas com níveis mais altos de confiança midiática.

H3) O consumo de notícias aumentou entre as pessoas que se preocuparam mais com o impacto da Covid-19.

           Em relação ao consumo de diferentes mídias, os autores demonstram que o consumo de canais digitais de notícias foi o que mais cresceu ao longo da pandemia da Covid-19. E o consumo de notícias em redes sociais digitais e em canais de televisão também aumentou. Em contrapartida, jornais e rádio sofreram uma queda de audiência nos países estudados. Dessa forma, os autores confirmam a H1 apenas parcialmente e confirmam a H1a e a H1d.

            Em termos de mídia televisiva, os resultados mostram que os países, em geral, apresentaram maiores audiências tanto para canais de serviço público, quanto para canais comerciais – o que refuta a H1b. E no caso dos jornais, a redução da audiência se mostrou significativa somente para a imprensa popular. Mesmo assim, a H1c também foi refutada.

            A associação entre o consumo de mídias tradicionais e a confiança midiática também se confirmou (em 13 países). Em outras palavras, o aumento do consumo de notícias em mídias tradicionais foi maior entre aquelas pessoas que dispunham de maior confiança midiática antes da pandemia. Em contrapartida, o consumo dessas notícias foi menor entre as pessoas com baixos níveis de confiança midiática antes da pandemia. Além disso, os autores mostram que efeito negativo para low trusters foi em média, maior do que o efeito positivo para high trustors. A H2, portanto, foi confirmada.

            E, por fim, a preocupação com a Covid-19 também ocasionou aumento no consumo de notícias em mídias tradicionais, digitais e em redes sociais digitais – confirmando a H3. Esses resultados foram semelhantes em todos os países estudados, apresentando pequenas variações.

            Os autores destacam, ainda, que o texto encontrou mais um efeito moderador importante: a frequência de consumo de notícias antes da pandemia. Ao mesmo tempo que consumidores frequentes não aumentaram suas horas de consumo, consumidores não tão frequentes o fizeram, reduzindo, assim, a lacuna entre aqueles que evitam notícias e aqueles que as obtêm regularmente.

            Sobre o aumento da audiência de noticiários televisivos e digitais, os autores atribuem os resultados às frequentes coletivas de imprensa e à necessidade de informações rápidas a respeito da crise.

            A relevância do texto está em buscar compreender como as pessoas se informam em períodos de crise sanitária. E, no que se refere à pandemia da Covid-19, essa é uma questão especialmente relevante diante de toda a desinformação que marcou o período. Teorias conspiratórias foram criadas em torno da origem da doença; narrativas favoráveis a tratamentos sem eficácia comprovada foram amplamente divulgadas (inclusive por líderes políticos); e as vacinas tiveram sua eficácia e segurança frequentemente contestadas.

            Contudo, alguns limites do texto também podem ser apontados. No que se refere a ambientes midiáticos digitais, os autores não diferenciam canais tradicionais de empresas de comunicação non-mainstream – o que poderia trazer resultados relevantes, considerando a multiplicidade dos ambientes digitais. Além disso, a maior parte dos países considerados na análise são europeus. Os resultados, portanto, poderiam ser divergentes se outros contextos histórico-sociais fossem levados em conta.

REFERÊNCIA

Van Aelst, P. et al. Does a Crisis Change News Habits? A Comparative Study of the Effects of COVID-19 on News Media Use in 17 European Countries. Digital Journalism, 2021.

* Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Ciência Política da Universidade Federal do Paraná. Mestra em Ciência Política e Bacharela em Ciências Sociais pela mesma universidade. Bolsista Capes. Integrante do Grupo de Pesquisa em Comunicação, Política e Tecnologia (PONTE).

As opiniões expressas pela(o)s autora(e)s pertencem a ela(e)s e não refletem necessariamente a opinião do Grupo de Pesquisa e nem de seus integrantes.

Back To Top
Search