O conceito de opinião pública: um debate a partir de texto de Patrick Champagne
Por Felipe Schwarzer Paz*
A obra “Formar a opinião: o novo jogo político”, escrita pelo sociólogo francês Patrick Champagne, trata do desenvolvimento do conceito de opinião pública. O autor inicia a abordagem pela primeira definição no dicionário francês de opinião (o texto tem grande enfoque na situação da França). Constata que, historicamente, existiram inicialmente dois tipos: uma que seria a opinião desqualificada do público em geral e outra que seria a opinião especializada e a verdadeiramente válida.
Assim, com a maior importância conferida ao conceito, também surgiram disputas entre aqueles que defendiam uma democracia direta e aqueles que defendiam uma representação racional por uma minoria. Porém, com medo de não satisfazer o povo e perder o poder, os “homens da constituição” optaram por uma democracia representativa (o texto passa pelos diferentes usos do conceito − nesse caso também tecendo críticas alinhadas às de Bourdieu e, consequentemente, tratando da instrumentalização da opinião pública).
De início, explica o autor, o conceito serviu menos como uma medição das vontades populares e mais como um tipo de arma política burguesa para adquirir legitimidade − como o uso das tecnologias de sondagem para satisfazer objetivos tradicionais da política mais à frente, tal como John Thompson afirma. Isso foi essencial dado o momento em que se estabeleceu essa ideia, um contexto em que os Parlamentos buscavam se apresentar como melhor alternativa ao absolutismo, se utilizando disso para construir uma imagem de abertos ao público e transparentes, mesmo sendo apenas a opinião publicada de uma pequena elite intelectual e urbana.
O texto aborda também o papel da mídia que surgia como forma de ampliar a opinião pública para que mais cidadãos tivessem acesso ao que acontecia no Parlamento, mas também como forma de criar um sentimento de pertencimento à nação (sendo seu desenvolvimento histórico melhor realizado que o de Thompson em “A mídia e a modernidade”). Por exemplo, Champagne expõe a relação ambivalente da imprensa de maneira clara, tanto como forma de informar o povo quanto como forma de domesticar estes com as pesquisas de opinião e a geração de falsos consensos. A imprensa sofreu censura no começo, relata, justamente por dar voz ao “povo”, e com os jacobinos percebendo que a opinião destes era muito distante da erudita.
A obra traz ainda discussões sobre como funciona a representação (quem é representado e como representar uma maioria silenciosa frente a uma minoria ativa) e trata sobre a massificação da opinião para ignorar minorias (gerar um consenso ilusório sobre um determinado tema com as pesquisas de opinião).
Nesse sentido, aborda também as manifestações como forma mais física de expressar a opinião, fator que o autor afirma ser responsável por popularizar essa forma de expressão, mesmo que no começo sofresse repressão excessiva e tivesse uma violência mais intensa envolvida. Porém, que apresenta uma resistência na conceituação como “opinião pública”, visto que são comumente realizadas por minorias, além de não poder afirmar que todos em uma manifestação pensem da mesma forma. Tal como dito por Durkheim: “se todos os corações vibram em uníssono, não é por causa de uma concordância espontânea e pré-estabelecida, é que uma mesma força os move no mesmo sentido”. É, portanto, no máximo a concordância em uma pauta específica. Nesse sentido, assume que representa menos a opinião de uma grande parcela de indivíduos e mais uma parcela do “público” que se destaca da multidão. Esse movimento tinha a ver com a ausência de um sufrágio universal, mas que, com a pressão exercida, acabou por se realizar e, assim, as manifestações ficaram mais pacíficas, não sendo mais elemento de imprevisibilidade política, uma instrumentalização.
Por fim, o texto assume a dificuldade de definir o termo de maneira científica – o que contrapõe os escritos de Alfred Sauvy, vindos de um período antes da popularização das sondagens, para o qual questões como estas são uma deformação da opinião e que a verdadeira opinião a se analisar seria aquela pública, feita de maneira qualitativa. O que se aproxima do defendido por Fabián Echegaray, que afirma que apenas pode existir uma definição social de opinião pública. Neste sentido, o texto retoma a definição do Institut français d’opinion publique (IFOP) de que a opinião pública é “a avaliação obtida nas pesquisas de sondagem”. E amplia essa simplificação, indicando a opinião pública como um objeto que apenas assiste ao jogo político, um ator político com direitos e que deve ser escutado, ou um ator coletivo que pode ser enganado e que deve ser guiado pelos políticos e intelectuais.
REFERÊNCIA PRINCIPAL:
CHAMPAGNE, Patrick. Formar a opinião: o novo jogo político. Petrópolis. RJ.: Vozes, 1996.
REFERÊNCIAS COMPLEMENTARES:
BOURDIEU, P. A opinião pública não existe. In Michel Thiollent, Crítica metodológica, investigação social e enquete operária (4 ed.) (pp. 137-151). São Paulo: Polis, 1987.
DURKHEIM, E. As regras do método sociológico. 13.ed. São Paulo: Nacional, 1987 (Texto originalmente publicado em 1895).
ECHEGARAY, F. O papel das pesquisas de opinião pública na consolidação da democracia: a experiência latino-americana. Opin. Publica [online]. vol.7, pp.60-74, 2001.
THOMPSON, J. B. A Mídia e a Modernidade: uma teoria social da mídia. Petrópolis, Vozes, 2002.
* Felipe Schwarzer Paz é graduando em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Paraná. Lattes: http://lattes.cnpq.br/1158432600480938.
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