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A força do Facebook em comunidades locais

Gisele Barão da Silva*

Há tempos que a informação sobre política saiu do circuito exclusivo das empresas jornalísticas tradicionais e se dispersou em redes mais amplas de disseminação, como blogs e redes sociais digitais. Para além da mudança de plataforma, essa expansão inclui a participação de novos atores responsáveis pela produção e circulação desse conteúdo, e não apenas os jornalistas profissionais.

No que diz respeito a pequenas comunidades, que muitas vezes sequer possuem veículos locais para atender às necessidades de informação e vivem nos chamados “desertos de notícias”, é nessas fontes não-jornalísticas, por assim dizer, que as pessoas consomem conteúdo sobre política para tomar decisões e fazer parte, de alguma maneira, da vida cívica. Essas ferramentas passam a integrar, assim, a infraestrutura na circulação da informação local. Estamos falando de instituições, entidades comunitárias, organizações não-governamentais, entre outros.

Publicado na revista Digital Journalism em 2020, o artigo “Platform Civics: Facebook in the Local Information Infrastructure” (Kjerstin Thorson, Mel Medeiros, Kelley Cotter, Yingying Chen, Kourtnie Rodgers, Arram Bae, Sevgi Baykaldi) busca compreender essas infraestruturas de informação política, especialmente do ponto de vista de quem produz, seja jornalisticamente ou não. Como é o envolvimento desses atores na produção e circulação de informação? Quais são seus modos de trabalho, desafios e dificuldades? Qual o impacto dessas infraestruturas na democracia?

O ponto de partida dos autores para desenvolver seu argumento são dois fenômenos recentes da comunicação política. O primeiro é o já citado crescimento da participação de novos sujeitos na produção de informação política em comunidades locais. O segundo são as formas como essa lógica da mídia molda práticas cotidianas de produção e circulação de conteúdo. O que os autores definem como infraestrutura de informação segue a conceituação de Bowker et al. (2009): um conjunto de tecnologias, serviços e práticas em rede para permitir fluxos de informações.

A metodologia mistura uma análise de posts no Facebook de meios jornalísticos e não-jornalísticos em uma cidade de médio porte dos EUA entre 2017 e 2018; e entrevistas com comunicadores em organizações sem fins lucrativos, governo local e outras entidades. Foram entrevistadas 18 fontes e coletados dados de 122 contas da rede social. O corpus final somou 33.811 postagens.

De maneira geral, além de comparar as diversas organizações quanto à quantidade de informações que produzem no Facebook, o estudo procura entender suas diferenças quanto ao engajamento, rotinas de produção e circulação; até que ponto dependem da rede social para se comunicar com o público; e como a dependência restringe ou permite que elas contribuam para o fornecimento de informações políticas na comunidade.

Entre as descobertas mais interessantes do artigo está uma resistência, por parte das pessoas responsáveis pelos posts, em abordar temas polêmicos. Isso ocorre, aparentemente, por dificuldades em lidar com repercussões negativas das postagens. Embora os conteúdos gerem engajamento e visibilidade, a informação política depende de um poder de “gestão de crise” que ultrapassa as habilidades mais simples de produção e circulação, por exemplo. Esse receio se dá principalmente nos perfis não-jornalísticos.

Ao mesmo tempo, a pesquisa revela como esses grupos são cada vez mais dependentes do Facebook para acesso ao seu público. Vale considerar que a lógica dessa plataforma ora restringe e ora amplia a visibilidade da informação dentro de uma determinada comunidade, e que é preciso que os comunicadores sigam determinadas regras para fazer com que seu conteúdo atinja mais pessoas.

Entre os pontos de destaque do estudo está a metodologia adotada. Isso porque as entrevistas foram realizadas presencialmente e, durante a conversa, o participante e o entrevistador liam juntos alguns posts das redes sociais publicados pela organização, discutindo os dados em conjunto. É um diferencial que parece ter dado mais segurança e eficiência à análise.

Fica evidente que o acesso facilitado às ferramentas para produzir e divulgar informações políticas não significa que esse processo seja igualmente fácil de gerenciar. Os entrevistados revelam dificuldades para realmente construir uma comunidade de consumidores, sem falar na pressão para aumentar o engajamento e manter seu público – o que é uma exigência do próprio algoritmo dessas plataformas. Ou seja, produzir e disseminar informação não é sinônimo de atingir o público desejado, muito menos da forma desejada. A tomada de decisão sobre o que publicar se mostra um desafio pertinente a se estudar nesses grupos de informantes.

Essa preocupação se dá especialmente porque notícias com alto grau de controvérsia – temas que dividem opiniões, por exemplo – podem afetar negativamente a credibilidade e a reputação dos grupos. Nesse sentido, por mais que um post possa gerar o engajamento desejado, pode não ser pelo motivo que a organização esperava. Aderir à lógica de funcionamento das redes sociais e ainda preservar imagem e credibilidade são desafios maiores do que o acesso facilitado às redes pode fazer pensar.

Referência

THORSON, K. et al. Platform Civics: Facebook in the Local Information Infrastructure. Digital Journalism, v. 8, n. 10, p. 1231–1257, 2020.

* jornalista da E-Paraná Comunicação e Doutoranda em Comunicação pela Universidade Federal do Paraná.

As opiniões expressas pela(o)s autora(e)s pertencem a ela(e)s e não refletem necessariamente a opinião do Grupo de Pesquisa e nem de seus integrantes.

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